terça-feira, 16 de setembro de 2008

Itinerância Formativa...




Sou de nascida na cidade de Jequié e os meus pais (Paula e João – em memória) vieram de municípios pequenos e não tiveram oportunidade de estudar. Meu pai faleceu analfabeto e minha mãe era analfabeta funcional. Fomos nós (eu e meus sete irmãos) que a ensinamos a assinar o nome, motivo de grande alegria para ela.
Cresci ouvindo que estudar era importante. Minha mãe oferecia tudo o que não teve a nós para que continuássemos na escola, mesmo com tantas dificuldades que era desde a falta de materiais básicos como caderno, lápis, borracha etc. até a falta de uma boa alimentação e de saúde. Porém, minha mãe sempre me motivava a ir às aulas. Ela acreditava que a educação poderia nos dar melhores condições de vida do que a que ela levou.
Iniciei na escola aos sete anos. Na época só havia disponibilidade de vagas para educação infantil em escolas particulares. E como minha família não tinha condições financeiras para aplicar em educação, então foi preciso chegar aos sete anos para dar início aos estudos.
Não tenho muitas lembranças do primeiro ano a não ser de algumas atividades com lápis de cores e da dureza da professora em relação às idas ao banheiro e por causa disso eu acabei passando algumas situações vexatórias frente aos meus colegas.
As escolas em que eu estudava eram distantes de minha casa, às vezes em outro bairro. Além da distância que havia para chegar à escola, eu também tinha que realizar a atividade sozinha. Meus irmãos precisaram trabalhar cedo e eu ficava com minha mãe em casa e como ela não sabia ler, não podia me ajudar.
Na quarta série fui para a recuperação final em três disciplinas: Matemática, Estudos sociais e Ciências. Havia sido aprovada apenas em Português, com a média 5,0. Para surpresa minha, quando fiz a primeira avaliação (Estudos Sociais), recebi a notícia de que não poderia fazer as outras avaliações por estar reprovada já primeira tentativa de aprovação. Na verdade eu não sabia muita coisa. A professora fazia os famosos ditados de palavras e de textos e eu não conseguia acompanha-la, nem tinha muito êxito na escrita. Recordo da sabatina matemática que era costumeira em nosso meio. Neste período eu consegui decorar a tabuada toda para responder às perguntas relacionadas à multiplicação e divisão.
Repeti a quarta série na escola Anísio Teixeira aos doze anos. Neste período eu me despontei e tomei gosto pelos estudos. Era muito aplicada. A partir daí não tive mais problemas com os estudos. Foi neste mesmo ano que comecei a pensar no meu futuro, o curso que queria fazer na universidade e, não era pedagogia...
Ao término do segundo grau já pensava em fazer pré-vestibular, porém o custo mensal estava longe do meu orçamento, por isso fiquei quase três anos para prestar o vestibular. Até que um dia me despertei para estudar sozinha em casa, e foi aí que tentei passar no curso de enfermagem, meu sonho de adolescência. Porém, “seleção social” impediu minha aprovação. Após essa tentativa, escolhi biologia, e fui aprovada em 34º lugar num curso que só tem trinta vagas. Só depois é que pensei em pedagogia. Prestei o vestibular e fui aprovada. A notícia alegrou o meu coração e então me decidi fazer valer o esforço pelos estudos. É uma pena que minha mãe não está mais aqui para se alegrar comigo.

Já matriculada e realizada por estar numa universidade pública, comecei a freqüentar a aula cada vez mais interessada no curso e me sentido encantada pelo vasto campo de conhecimentos ligado às diversas áreas onde o ser humano está inserido (sociologia, psicologia, filosofia, história da educação, Ciências Políticas etc.). E estes conhecimentos me ajudavam (e ajudam) a qualificar minha atuação no contato com os grupos e pastorais com os quais desenvolvo trabalhos (Pastoral da Juventude, CAPS – AD, Jovens dependentes químicos, Pastoral Carcerária, CEB’s, Serviço de Animação Vocacional e Abrigo dos Idosos/as).
A cada semestre cursado vou percebendo o gosto pelo curso de Pedagogia. Tenho algumas críticas a serem feitas em relação à metodologia utilizada por alguns docentes, contudo, não deixo isso ofuscar a admiração que tenho pelos professores/as compromissadas e não perco de vista que seus exemplos de trabalho tiveram grande parcela de contribuição no meu zelo pelo curso e pela educação.
À medida que o tempo vai passando, fica clara a importância de cada disciplina na grade curricular, como elas se entrelaçam e se completam possibilitando a nós discentes, uma compreensão holística do homem/mulher e não uma visão fragmentada, reduzindo-os a mentes pensantes que estão na sala de aula desprovidos/as de suas experiências e conhecimentos adquiridos em ambientes que não são escolares.
Agora, no último semestre, contemplo a riqueza de conhecimentos adquiridos, construídos, partilhados ao longo do curso e, acima de tudo, a responsabilidade que tenho com a educação das classes populares. Desejo fazer de minha prática pedagógica um momento de ação, reflexão, pesquisa, troca de conhecimentos e ação refletida com objetivo de oferecer aos estudantes que estiverem sob minha responsabilidade, algo melhor do que recebi dos professores/as com quem estudei
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